REGIONAL

Na busca pelo 1º emprego, distância e preconceito viram obstáculos a jovens da periferia de SP

G1 mostra as dificuldades enfrentadas por seis pessoas de bairros distantes do Centro na busca por carteira assinada

Publicado às 8h

G1 São Paulo

Num país em que a taxa de desemprego subiu para 12,7% no 1º trimestre de 2019, atingindo cerca de 13,4 milhões de brasileiros, conseguir um primeiro trabalho formal é um desafio hercúleo para jovens de 18 a 24 anos. A situação piora quando o endereço no currículo indica um bairro periférico.

O G1 ouviu seis jovens de São Paulo que enfrentam essas dificuldades, e todos foram categóricos: além da falta de experiência, a distância e o preconceito dos possíveis empregadores são as maiores barreiras a serem superadas.

60 km diariamente

Nascido em Cidade Tiradentes, bairro da Zona Leste de São Paulo, Caio Araújo, de 23 anos, nunca trabalhou formalmente e está em busca do primeiro emprego com carteira assinada para auxiliar nas despesas de casa e conseguir maior independência financeira.

Ele chegou a cursar o primeiro ano de psicologia, mas teve a bolsa de estudos cortada e não pôde arcar com os custos da mensalidade.

Um dos empecilhos para concorrer a uma vaga foi seu endereço. Geralmente ele precisa omitir ou mentir sobre o local onde mora para concorrer a uma vaga por dois motivos: o preconceito do mercado com moradores da periferia e a distância, já que muitas empresas se recusam a arcar com o benefício do vale-transporte.

Diariamente ele percorre 60 km de ônibus e Metrô: 30 km para ir da Zona Leste até o Centro, e outros 30 km para voltar. Tudo para entregar currículos em agências, lojas e escritórios.

“Eu me sinto como se fosse um pedinte, porque eu não sei se deveria ser assim, eu me sinto desconfortável. Eu não quero atrapalhar o trabalho de alguém para pedir um emprego. Parece um esforço em vão, porque não tem retorno”

Próximo onde mora não há muitas opções de comércio, então a região central se torna mais atrativa para a procura. “No Centro da cidade tem maior mobilidade, mais comércios. As pessoas vêm da periferia justamente para trabalhar, então acabam tendo mais oferta de emprego. É mais comum ser contratado mesmo sendo emprego mais básico, nada muito pretensioso”, afirma.

Enquanto o primeiro emprego não vem, assim como outros jovens ele opta pela informalidade, com trabalhos temporários e freelas para conseguir ter uma grana no fim do mês.

Victor e André se preparando para sair de casa para ir até o Centro. Foto: Marcelo Brandt/G1

Currículo rasgado e falta de experiência

Na Vila Brasilândia, Zona Norte, os amigos André Augusto Porfírio e Victor Alves de Souza, de 18 e 20 anos, seguem com a carteira de trabalho em branco. Eles vão sempre juntos ao Centro da cidade em busca de vagas.

Victor procura emprego há dois anos. Nesse tempo, conta que já fez entrevistas e até passou em uma vaga para porteiro, mas não pôde assumir o cargo porque precisaria fazer um curso. “Já estava tão difícil para arrumar o dinheiro da passagem [de ônibus], imagina para fazer o curso ”, admite o jovem.

As buscas renderam situações humilhantes até.

“Entreguei e saí andando. Quando eu virei as costas, ele estava rasgando meu currículo”, diz Victor.

Para o jovem, o possível empregador pode ter feito isso por racismo e por ter preconceito com o bairro onde ele mora.

Munidos de um guia de agências – lista com os endereços das agências de emprego em São Paulo, vendido por R$ 3 – Victor e André costumam ir para a Rua Barão de Itapetininga, no Centro, entregar currículos e fazer cadastro nas mais de 20 agências da rua.

Para André, uma das maiores dificuldades para conseguir o primeiro emprego é a falta de experiência.

“Se ninguém abrir uma porta para mim, como que eu vou ter experiência? Então, para eu ter emprego hoje, eu preciso ter experiência, mas como, se sou de uma geração nova e nunca trabalhei? ”, desabafa André.

André disse que gostaria de usar sua bicicleta para fazer entregas por aplicativos, mas mora longe do Centro, em uma região alta, com grandes ladeiras.

Enquanto o registro na carteira não vem, os amigos fazem bicos com o que aparece. “Tem dia que eu acordo, ponho na minha cabeça: ‘É hoje que eu vou conseguir’”, diz Victor. Mas a oportunidade ainda não apareceu. “Isso desanima bastante, mas nada que nos faça desistir”, completa André.

Uma pensão para cinco pessoas

Ainda na Vila Brasilândia, Joelma do Nascimento Lima, de 19 anos, também omite o endereço por conta do preconceito. “Às vezes eu vejo até no olhar da pessoa. Quando eles perguntam em que bairro eu moro, digo outro bairro por vergonha de falar que moro aqui, porque a Brasilândia é vista como um lugar perigoso.”

A jovem mora em uma pequena casa com o marido, o filho de 1 ano e 6 meses, a sogra e a cunhada -todos desempregados. A única renda vem da pensão que a sogra recebe pela morte do marido dela: R$ 1.300 que mal dão para bancar o aluguel.

“O aluguel aumentou, a água, a luz, tudo ficou muito caro por aqui. Acaba ficando tudo para a minha sogra, e às vezes a gente não consegue segurar as contas”, diz Joelma.

Por isso, muitas vezes falta o que comer. A principal refeição do filho de Joelma é feita na creche.

Para não ficar longe do filho, geralmente Joelma procura emprego em lojas e comércios locais mais próximos da Brasilândia, como nos bairros de Parapuã, Lapa e Barra Funda. Isso nos dias em que consegue arcar com o valor da passagem. Pela falta de experiência e formação, está disposta a aceitar o que vier. Mas, mesmo assim, as oportunidades são cada vez menores.

Joelma admite que de vez em quando fica desanimada e até pensa em desistir de procurar pelos tantos “nãos” que já levou.

A jovem nasceu no município de Miracatu e veio com a irmã para São Paulo para buscar melhores condições financeiras. Joelma cursou apenas até o segundo ano do ensino médio, mas está buscando maneiras de terminar os estudos para prestar vestibular para Engenharia Civil.

Geração da informalidade

Com a falta de contratações formais no mercado, grande parte dos jovens que está desempregada acaba recorrendo à informalidade como uma fonte de crescimento de renda, os famosos “bicos”, com horas de trabalho exaustivas para receber menos de um salário mínimo.

Em Paraisópolis, na Zona Sul, Karla Luara, de 19 anos, nunca trabalhou formalmente. No currículo, o bairro Paraisópolis se torna Vila Andrade por conta do preconceito com o local.

“O povo não gosta muito, acha que só tem gente mal intencionada em Paraisópolis”, afirma.

Ela nunca teve um registro na carteira e sua prioridade é aceitar o que vier. A informalidade se torna a melhor opção por ser algo mais acessível. “Eu estou até entregando currículo, mas está difícil. É mais fácil conseguir temporário”, afirma.

Seu último emprego foi a cerca de dois meses como panfleteira. Geralmente entrega currículos em lojas, comércios locais e nos shoppings próximos a Paraisópolis. Quando falta dinheiro para a passagem, vai andando de casa até o Shopping Jardim Sul, uma caminhada de mais de 30 minutos.

Desistiu de procurar

O Danilo Siqueira Lopes, de 25 anos, está desempregado há 2 anos e desistiu de continuar procurando um emprego formal. Enquanto a carteira não é assinada, consegue renda com “bicos” em lava rápido e construção. “O que aparecer acabo encarando.”

Danilo mora com três irmãos na Vila Brasilândia, cursou até o segundo ano do ensino médio e tem um filho de 6 anos que reside com a mãe.

Ele sempre procurou emprego em lugares mais próximos por falta de recursos até para se locomover. Após um ano de buscas, sem sucesso, Danilo afirma: “Eu já procurei bastante, hoje eu desisti, desanimei demais”, disse.

“Lá na Lapa, eu já andei mais de 100 vezes para cima e para baixo. Eles mandam deixar o currículo, preencher ficha. Mas às vezes é só desperdício de papel e dinheiro. A pessoa nem olha para a sua cara, nem dá uma oportunidade de você falar direito”, afirma Danilo.

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