Publicado às 11h10
Por Cristina Braga
A Vila Leopoldina, cobiçada há décadas pelos empreendimentos imobiliários de alto padrão e metro quadrado supervalorizado, tem na sua configuração urbanística problemas sociais imensos, como uma minicracolândia em torno da Ceagesp e pessoas em situação de vulnerabilidade, pelas ruas do bairro. Além da mudança da Ceagesp, que pode dar um outro desenho para a região, com o incremento de pólo tecnológico, a Leopoldina contará com outra transformação.
No Plano Diretor Estratégico (PDE) de 2014, está estabelecida uma ferramenta a fim de articular ações públicas nas áreas de saúde, habitação e transportes que são os projetos de intervenção urbana, no caso, o PIU Leopoldina – Villa Lobos. Ele compreende um quadrilátero entre as avenidas das Nações Unidas, Queiroz Filho, ruas Avelino Chaves e Professor Ariovaldo Silva, coladinho à Ceagesp, onde estão assentadas duas comunidades: da Linha e do Nove (em frente ao portão 9 da Ceagesp) e o conjunto de habitação popular Cingapura Madeirite. Somados, estima-se que habitem cerca de 3 mil moradores, ou quase 700 famílias – perto de três lotes do grupo Votorantim distribuídos em dois quarteirões, num total de aproximadamente 290 mil m².
Com o objetivo de reestruturação do entorno, foi protocolado na Prefeitura, em 2016, uma Manifestação de Interesse Privado (MIP) pela Votorantim e o Instituto de Urbanismo e Estudos para a Metrópole (URBEM), para fazer uso da área dentro de grande requalificação que prevê moradias classificadas como Habitação de Interesse Social. A Votorantim é proprietária de cerca de um terço desse perímetro, em área de produção de cimento, agora desativadas.
Habitação Popular
“O PIU Leopoldina é uma grande oportunidade que o município de São Paulo tem de, além da empresa interessada, a Votorantim, fazer diversos investimentos na região, como Conjunto Habitacional, para atender essas comunidades. Estão previstas, aproximadamente, mais de 600 apartamentos que serão entregues dentro dessa operação sem custo para o município”, afirma Fernando Chucre, secretário municipal da Habitação.
Além disso, a contrapartida vinda da outorga onerosa (o direito de construir acima do permitido pela Lei do Zoneamento) da Votorantim – em seu próprio terreno de 110 mil m² – visa a construção de Unidade Básica de Saúde (UBS), creche, abertura de ruas, CTA (Centro Temporário de Acolhimento) e a reforma do Cingapura Madeirite, abrigando, no térreo, comércio irregular – previsto para ser transferido para outra área.
Segundo Marcelo Ignatios, superintendente de estruturação de projetos da SP Urbanismo, o PIU Leopoldina – Villa Lobos “só tem sentido se essas famílias forem realocadas em terrenos próximos, como o da SPTrans, demarcado como Zeis – Zona Especial de Interesse Social 3, e que as áreas ocupadas pelas comunidades voltem a ser de uso público”.
Trinta mil metros quadrados: contaminado?
A grande questão para alguns moradores é a realocação dessas comunidades para o terreno da SPTrans e CET (ex-garagem e oficinas de ônibus da CMTC). São 30 mil m² que vem passando por processo de descontaminação ao longo de 15 anos, recebendo inúmeras interrupções. Este ano, a Servmar Ambiental e Engenharia foi contratada para elaboração de novo estudo ambiental no pátio, localizado na Avenida Imperatriz Leopoldina, 928, espaço nobre do bairro.
O valor do contrato com a Servmar é de R$ 250 mil e deve ser concluído até dezembro de 2017. Marcelo Ignatios enfatiza que “ainda não se tem a exata dimensão de como será a descontaminação. Temos a expectativa de que não seja drástica. Laudos preliminares já apontaram ser viável moradia popular e esperamos que traga em qual parte do terreno já estaria disponível para início do assentamento dessas famílias. O terreno é a principal alternativa, mas não é a única”, finaliza. Já Carlos Alexandre, diretor da Associação Vila Leopoldina (AVL) entende que a Votorantim deseja apenas promover um êxodo dessas comunidades para uma área contaminada, que coincidentemente tem o mesmo tamanho daquelas ocupadas por Linha, Nove e Cingapura. “Isto, inclusive, contraria os propósitos da própria Lei, pois não se pode suprimir uma ZEIS1 (onde estão atualmente) e simplesmente migrar a população para o outro lado da Avenida Gastão Vidigal.”
Alexandre se baseia em diversos estudos internacionais e laudo da Cetesb, que aponta contaminação por hidrocarbonetos e óleo no lençol freático “que corre o risco de incendiar”. Para ele, a área contaminada jamais deveria ter sido demarcada como ZEIS, já que a Lei 16050 de 31/07/14 em seu artigo 45 diz que “deverá ser evitada a demarcação de novas ZEIS nas áreas que apresentem risco à saúde ou à vida, salvo quando saneados, e em terrenos onde as condições físicas e ambientais não recomendem a construção”, aponta o diretor da AVL.
Por outro lado, Welton Washington Vieira de Oliveira representante das comunidades do Nove e da Linha, disse que está acompanhando o processo de contaminação e acredita “não ser grave e pode ser resolvido; merecemos moradia digna, a questão é que o terreno da ex-CMTC está ao lado de condomínios sofisticados, justifica.
Enquanto o laudo não vem, Marcelo Ignatios salienta que o PIU tem um rito a ser percorrido para ser implantado e que Projeto de Lei será submetido à Câmara dos Vereadores, ainda em 2017. Antes disso, segundo ele, está passando por ajustes e diálogos entre os proponentes e as secretarias envolvidas como Habitação, Saúde, Verde e os moradores do bairro.
A Prefeitura pretende dialogar com a população organizando a primeira oficina no mês de novembro com as comunidades atingidas. “Temos um processo sem queimar etapas, transparente, participativo e audiência pública”, esclarece Ignatios. Cabe a população aproveitar a oportunidade para achar o melhor caminho, no diálogo, com o poder público.
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